COMPROMETIMENTO DOS PODERES

As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.

domingo, 30 de agosto de 2015

MAS QUE DROGA, MINISTRO!



ZERO HORA 30 de agosto de 2015 | N° 18279



PERCIVAL PUGGINA*


A descriminalização da posse de pequenas quantidades de drogas me parece mais um assunto de aritmética elementar: a soma das pequenas frações em que se divide um todo é exatamente igual ao todo. Além de ser entendida como liberação e estimular o consumo, a descriminalização vai ampliar o exército dos pequenos traficantes, que trabalharão comercializando porções menores.

Interessado no tema, assisti, pela TV, à sessão do STF que iria deliberar sobre a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei de Drogas. Após o voto de Gilmar Mendes, favorável à descriminalização, um pedido de vistas sustou o julgamento. Enquanto ouvia o ministro, na condição de relator, falar em “interferência no direito de construção da personalidade dos usuários” e em “uma conduta que, se tanto, implica apenas autolesão”, caiu-me a ficha: naquele plenário, não há um único magistrado – unzinho sequer! – que se possa identificar como conservador, ou seja, que reflita os valores compartilhados pela maioria da sociedade.

Não estou defendendo, aqui, cadeia para portadores de pequenas quantidades, mas a manutenção do tipo penal, com aplicação das sanções alternativas já previstas. Tampouco estou afirmando que os ministros devem pensar como eu em questões referentes a costumes e valores. Se nem os parlamentos devem estar constritos a uma regra de representação proporcional compulsória das opiniões manifestas na sociedade, menos ainda estará o STF.

Não obstante, é manifestamente um problema não haver, entre os 11 ministros, um único conservador. Como é possível faltar contraponto aos ditos “progressistas”? Não raro, a apresentação do contraponto fica por exclusiva conta de quem defende o ponto. É o que acontece quando, ao emitir seu voto, o julgador analisa o contraditório, afirmando que se pode antepor tais e tais argumentos ao que ele está sustentando, mas que esses argumentos não se aplicam em virtude de tais e quais razões. Assistindo a isso, sinto falta de quem diga: “Pode deixar, excelência, que minha posição defendo eu”. Mas não há quem o diga, nem quem defenda tal posição. Ao menos não em igualdade hierárquica, nem com direito a voto.

Haverá quem se escandalize com este texto. Existem pessoas que veem com muita naturalidade magistrados garantistas soltando bandidos, ministros do STF inegavelmente partidários, socialistas, marxistas, ateus, agnósticos, “progressistas”, politicamente corretos ou seja lá o que forem. Mas conservadores? Conservadores não, que absurdo! Com posições econômicas liberais? Também não, imagina! E assim, os 11 vão tornando a política e o pluralismo um luxo ocioso, levando o país para onde apontam seus narizes.

*Escritor puggina@puggina.org

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

TRÁFICO PROIBIDO, USO LIBERADO?



ZERO HORA 12 de agosto de 2015 | N° 18257


ITAMAR MELO*


CONSTITUCIONALIDADE EM DEBATE

JULGAMENTO NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL amanhã pode alterar entendimento sobre o porte de drogas para consumo próprio


Uma nova era na política brasileira em relação às drogas pode ter início amanhã, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir se o porte de substâncias para consumo próprio é crime ou não. A atual legislação, de 2006, prevê penalidades para quem carrega drogas para seu próprio uso. Atuando no caso de um homem condenado por ter sido apanhado com três gramas de maconha, a Defensoria Pública de São Paulo pediu ao STF que considere esse regramento inconstitucional.

O recurso, que tramita no Tribunal desde 2011, está na pauta desta quinta-feira. Caso os ministros votem pela inconstitucionalidade, o Brasil teria, na prática, uma política em que o tráfico é proibido, mas o consumo fica liberado. Defensores do recurso esperam que o acórdão, que teria peso de jurisprudência, traga uma manifestação taxativa sobre a mudança de abordagem:

– O Supremo vai se pronunciar sobre o porte para uso próprio, mas seria importante uma afirmação clara de que consumir drogas psicotrópicas, assim como consumir álcool e cigarro, não é crime. Pode ser uma besteira, pode ser um erro, mas não é crime – afirma Rubem César Fernandes, secretário-executivo da Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia (CBDD).

Para sustentar sua tese, partidários do recurso da Defensoria Pública afirmam que a lei de 2006 fere o artigo 5º da Constituição, que garante o direito à privacidade e à intimidade.

– A lei penal existe para coibir a ação que causa dano a terceiros. O uso de droga não causa nenhum dano a terceiros. Causa danos apenas à própria pessoa que usa a substância. O direito penal não deve ser usado para coibir algo que a pessoa faz em sua esfera íntima – afirma Augusto de Arruda Botelho, presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD).

A possibilidade de que o STF reconheça a inconstitucionalidade preocupa entidades como a Associação Brasileira de Estudos de Álcool e outras Drogas (Abead), que defende a adoção de uma política baseada em prevenção, tratamento e controle da oferta. Há um mês, Ana Cecília Marques, presidente da entidade, encontrou- se com o ministro do STF Gilmar Mendes, relator do processo, e defendeu esse ponto de vista. Apresentou dados que apontam para um risco de aumento do consumo e reivindicou maior discussão:

– O ministro nos recebeu, nos ouviu e colocou alguns argumentos, mas era como se a decisão já estivesse tomada. Infelizmente, a sensação é de que vão aprovar isso.

DEPUTADO REJEITA ARGUMENTO DA LIBERDADE INDIVIDUAL

O deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS), presidente da Subcomissão de Políticas Públicas sobre Drogas da Câmara, rebate o argumento de que o consumo é uma questão de liberdade individual, afirmando que ele sobrecarrega outras pessoas, e afirma que descriminalizar o porte seria um primeiro passo para a legalização. O parlamentar entende que descriminalizar a droga significaria, na prática, legalizá-la, devido ao paradoxo que existiria entre a compra não ser crime e a venda ser criminalizada.

Para os defensores da mudança, a legislação atual já é ambígua e deixa margem para decisões baseadas na subjetividade. Ela não estabelece critérios claros para definir o que é tráfico e o que é porte para uso pessoal – o que, dependendo do caso, levaria à prisão de usuários, como se fossem traficantes.

– A lei atual é muito ambígua na diferenciação entre o que é para consumo e o que é para a venda, entre o usuário e o traficante. Estabelece uma pretensa liberalidade com o consumo, um extremo rigor com o comércio e uma zona cinzenta em que não sabe se está lidando com comércio ou com consumo. O agente acaba indo pelas circunstâncias, pela cara das pessoas, o que reforça preconceitos sociais graves – diz Rubem César Fernandes.

Caso o STF se pronuncie pela inconstitucionalidade da lei atual, espera-se que haja definição sobre quais as quantidades máximas que configurariam apenas o porte. Dias atrás, o próprio ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reconheceu que as “lacunas legais” para diferenciar traficantes e usuários geram violência e lotação de presídios.

*Com agências